O FANATISMO PARTIDÁRIO É TÃO IDIOTA COMO QUALQUER OUTRO

O Ministério da Educação está empenhado em reorganizar a educação especial. Com esse propósito, dizem os seus responsáveis, foram tomadas medidas novas muito corajosas e de efeitos estruturantes. Acreditam esses responsáveis que com estas novas medidas finalmente as coisas vão melhorar.
Como portugueses, devemos esperar e trabalhar para que as coisas melhorem mesmo. Mas quem acreditar que essa melhoria pode resultar das novas medidas, engana-se redondamente. Muito simplesmente porque essas medidas não são novas.
Vejamos:
  1. A centração da educação especial nas escolas – esta medida tem nove anos de idade. Na verdade, os cerca de 7000 professores de educação especial já são colocados nas escolas, na dependência orgânica directa dos Órgãos de Gestão das Escolas desde 1997, em todo o país.
  2. Equipas de educação especial nas escolas – esta medida tem 8 anos. O documento de 1998 sobre a Gestão já criou essas equipas, que são designadas de Núcleos deApoio Educativo e que são integradas nos Serviços Especializados de Apoio Educativo. Na verdade, os Núcleos deApoio Educativo são constituídos pelo conjunto dos docentes de educação especial, colocados nas escolas.
  3. Separação dos "Apoios Educativos" da Educação Especial – esta medida tem barbas de mais de cem anos. Em Portugal tem uma história de mais de 20 anos. O Congresso de Salamanca, de cujas conclusões o Estado Português é um subscritor, promovido pela ONU – UNESCO, superou essa dicotomia entre o movimento de escola para todos que era para todos menos para os deficientes, e o movimento de integração escolar que era para os deficientes mas não era para todos os desintegrados.
  4. Crédito horário para apoio educativo no 1º Ciclo – esta é uma medida com 2 anos; é do tempo do Governo de Durão Barroso e do Secretário de Estado Abílio Morgado, só que, na altura, dizia-se "apoio sócio-educativo". A fórmula é a mesma.

As medidas novas são a extinção das ECAEs e criação do quadro dos Grupo de Docência da Educação Especial.

As escolas, que colaboraram intimamente com as ECAEs, conseguiram assumir a responsabilidade da gestão dos docentes de educação especial, promovendo portanto a centração funcional da educação especial na escola. Aquelas, que entenderam que as ECAEs eram tão só um empecilho, não assumiram a centração funcional da educação especial na escola. As ECAEs, como instrumentos da Administração, foram, pelo menos na Região Norte (aquela que conheço), um factor importante de mudança positiva da postura das escolas face à educação especial.

A criação de quadros da educação especial, neste contexto de retrocesso ideológico e político, é um obstáculo à educação inclusiva.

Em suma, podemos dizer que as novas medidas na área da educação especial e o conjunto da "reforma" (manutenção de medidas antigas) nesta área correspondem a uma postura anarco-sindicalista delirante.

Vejamos mais em pormenor:

  1. Estas medidas rasgam o compromisso político do Estado Português com a declaração de Salamanca, ao estabelecer contextos diferenciados para os apoios educativos e educação especial; Portugal é um dos países signatários desta declaração tal como o é do Acordo de Quioto, por exemplo. Já sabemos que o contexto da educação especial é a escola, como dizem os reformadores; Que contexto será o dos apoios educativos?
  2. O Estado Português assume, com estas medidas, a destruição de equipas desconcentradas da Administração Educativa, confundindo esta destruição com autonomização da Escola. Em lugar de as reestruturar e redimensinar para novos desafios, extingue-as, sem sequer se preocupar em revogar o Despacho que as cria. Esta extinção e a ausência de reorganização dessas equipas locais atenta também contra a Declaração de Salamanca.
  3. A distinção dos ditos contextos dos apoios educativos e da educação especial é contra a legislação em vigor ainda não revogada (Despacho conjunto nº 105/97), para além de ser um retrocesso de mais de 20 anos.
  4. É destruida a estrutura da educação especial, sem que seja definido qualquer plano de curto, médio ou longo prazo para a reorganizar;
  5. Cria-se um quadro de educação especial, cujas condições de acesso antagonizam a formação profissional dos docentes
  6. Os fundamentos e diagnósticos apresentados resultam de estudos mal feitos e com dados errados, como os que apontam para um aumento constante de recursos docentes afectos ao apoio educativo, mau grado a decisão dos políticos de impedir (com sucesso) esse aumento ; ou para um aumento de 10 000 alunos deficientes sinalizados, como se esta sinalização tenha tido qualquer impacto na organização da educação especial, etc.
  7. Confunde-se autonomia da escola com demissão da Administração Educativa e portanto com a transformação das escolas em balcões, de atendimento ao público, do Ministério da Educação.
  8. Diz-se sem qualquer pudor que a criação dos quadros de educação especial corresponde à satisfação de uma velha reivindicação dos professores (leia-se: direcções dos sindicatos), como se de moeda de troca se tratasse para não ceder em outras reivindicações, porventura mais importantes.

Mais grave ainda: as críticas, que se produzam a este respeito, são tratadas como falta de lealdade à "organização", numa onda totalitarista que se julgava arredada do panorama político português.
Dirigentes de baixa condição combatem, com intrigas e maledicência, pelo poder, competindo para determinar qual deles é, do ponto de vista partidário, mais fundamentalista.
Vestem a camisola do clube e não conseguem ajudá-lo a ganhar os jogos; mesmo que o clube esteja a jogar mal, é o melhor do mundo. E quem disser o contrário arrisca-se a ser empurrado pela bancada abaixo.
Alguns puseram o cachecol só para mostrar o seu desportivismo; nunca foram do clube, mas agora são, porque o clube está a defrontar inimigos da ordem pública e sobretudo porque querem ver o jogo de cima.
O fundamentalismo partidário cega o Governo, levando-o a convencer-se de que não há outra solução que não seja a sua, e é tão irracional como qualquer outro fundamentalismo. Os partidários fundamentalistas do governo deviam ser colocados em prisão preventiva, para não continuarem a violar os direitos à liberdade dos outros.
Calados, esses fundamentalistas seriam muito mais úteis e a olhar para as nuvens, embasbacados como os parolos, seriam mais inteligentes.
O País e o Governo só tinham a ganhar com uma postura útil e inteligente desses fundamentalistas.


Deixe um comentário