ONDE ESTÁ A CONFUSÃO

Na Europa, os países nórdicos, desenvolveram um sistema educativo que se está a revelar racional e eficaz, por enquanto. Uma das suas características relaciona-se com o facto de os docentes serem preparados profissionalmente para acompanhar alunos dos 6 aos 16 anos. Os modelos de apoio à aprendizagem e de educação especial são muito beneficiados com esta concepção e prática da formação de professores: havendo necessidade, qualquer professor pode apoiar qualquer aluno em qualquer fase da sua vida escolar, entre os 6 e os 16 anos. Em Portugal, as condições do sistema educativo e da formação dos professores não permitem esta flexibilidade. Entendeu-se, portanto, que essa rectificação deveria ser realizada, não no sistema geral, mas no sistema de educação especial: os professores de educação especial são colocados independentemente da sua formação profissional de base, podendo um educador de infância trabalhar com alunos do 3º ciclo, e professores do secundário trabalhar com crianças de Jardim de Infância. O que acontece e torna ridícula esta opção é que as vantagens do sistema nórdico têm mais a ver com os professores "do regular" do que com os "do especial". As vantagens relacionam-se com a possibilidade de promover sistemas gradativos de apoio, inicialmente assegurados por professores regulares, e, só em casos verdadeiramente justificados, assegurados por docentes especializados. Ao optar-se pela perspectiva que coloca no centro a especialização do docente, o que acontece é exactamente o oposto do desejável: os professores do regular serão automaticamente considerados incapazes de providenciar o apoio a alunos com dificuldades (nem sequer estão capacitados para leccionar alunos de qualquer idade…, quanto mais alunos com deficiências). Reforça-se portanto a ideia de que a qualidade da educação não depende da formação geral dos professores, mas exclusivamente da sua formação especializada, o que me parece ser um enorme disparate.

Por outro lado, os modelos que separam a formação geral do professor da formação especializada para a educação especial são modelos que dificultam seriamente a integração escolar dos alunos com qualquer tipo de problema. São conhecidos os trabalhos que visam compatibilizar modelos construídos para segregar, com políticas integradoras e de inclusão. Na maior parte dos casos, sugere-se a rentabilização desses docentes e técnicos especializados que trabalham em escolas especiais, para se constituírem como recursos de apoio às escolas regulares. Em Portugal, está a fazer-se um esforço enorme para destruir as estruturas existentes de apoio à integração e inclusão de alunos com problemas, só para podermos falar como falam os países do Centro da Europa a respeito deste assunto. Só que, para chegar aos problemas deles, vamos precisar de muitos e muitos anos e de enormes investimentos, para depois recomeçar tudo de novo e destruir o modelo criado com tanto sacrifício. Para começar, precisaríamos de fazer "reboot" a toda a formação especializada, depois teríamos de investir em escolas especiais e só então poderíamos rentabilizar os seus recursos para apoiar as escolas regulares.
 
É claro que existem soluções alternativas:
1. A primeira coisa a fazer: definir com clareza o que se pretende do sistema educativo. Por exemplo, vamos adoptar o sistema nórdico ou algo semelhante, como eu defendo? Então vamos reorganizar todo o sistema de formação de professores. Daqui a alguns anos, teremos, se as políticas forem consistentes, uma nova e melhor realidade.
2. A segunda coisa a fazer: definir com clareza, para o conjunto do sistema, as medidas de transição compatíveis com esse modelo de futuro. Por exemplo: a reorganização da rede escolar do 1º ciclo é uma boa iniciativa, tal como o é a obrigação de os docentes dedicarem mais do seu tempo à escola. Outra seria o investimento na formação contínua dos professores de acordo com prioridades políticas de reconversão da sua formação.

3. Revogar todas as medidas (como as que dizem respeito à constituição dos quadros da educação especial) que não apostem na reorganização global do sistema e que acentuem a incapacidade de qualquer professor para apoiar qualquer aluno que demonstre dificuldades.

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